As Ferramentas Perdidas da Aprendizagem
Apresentado em um Curso de Verão em Educação, Oxford 1947
Publicado pela primeira vez em 1948
Que eu, cuja experiência em ensino é extremamente limitada e cuja vida nos últimos anos tem estado quase que completamente desconectada dos círculos educacionais, se proponha a discutir educação é uma questão que, certamente, não exige justificativa. É um tipo de comportamento para o qual o atual clima de opinião é totalmente favorável. Bispos expressam suas opiniões sobre economia; biólogos, sobre metafísica; celibatários, sobre matrimônio; químicos inorgânicos sobre teologia; as pessoas mais irrelevantes são nomeadas para ministérios altamente técnicos; e leigos escrevem para jornais dizendo que Epstein e Picasso não sabem desenhar. Até certo ponto, e desde que as críticas sejam feitas com uma modéstia razoável, essas atividades são louváveis. Especialização demais não é uma coisa boa. Há também uma excelente razão pela qual o mais completo amador pode se sentir no direito de ter sua opinião sobre educação. Afinal, se nem todos somos professores profissionais, todos nós, em algum momento, fomos ensinados. Mesmo se não aprendemos nada — talvez em particular se não aprendemos nada — nossa contribuição para a discussão pode potencialmente ter algum valor.
Sem me justificar, então, começarei. Mas, como muito do que tenho a dizer é altamente controverso, será agradável começar com uma proposição com a qual, tenho certeza, todos os professores concordarão cordialmente. E é a de que todos eles trabalham muito e têm coisas demais para fazer. Basta olhar para qualquer currículo escolar ou programa de avaliações para perceber que estão abarrotados de uma grande variedade de assuntos exaustivos a que são chamados a ensinar. E esse ensino interfere tristemente no que toda mente ponderada concordará serem seus deveres apropriados, como distribuir leite, supervisionar refeições, vigiar o vestiário, pesar e medir alunos, estar atento a casos incipientes de caxumba, sarampo e catapora, fazer listas, acompanhar grupos pelo Victoria and Albert Museum, preencher formulários, entrevistar pais e elaborar boletins de fim de período que combinem uma profunda veneração pela verdade com um terno respeito pelos sentimentos de todos os envolvidos.
Não me alongarei sobre esses deveres verdadeiramente importantes. Proponho-me apenas a tratar da questão do ensino propriamente dito. Quero investigar se, em meio a todos os inúmeros temas que figuram nos programas e ementas, estamos realmente ensinando as coisas certas da maneira certa; e se, ao ensinar menos coisas, de forma diferente, não poderíamos ter sucesso em "aliviar a carga" (como diz a expressão da moda) e, ao mesmo tempo, produzir um resultado melhor.
Essa perspectiva não precisa despertar nem esperança nem alarme. É altamente improvável que as reformas que proponho sejam algum dia postas em prática. Nem os pais, nem as faculdades de pedagogia, nem as comissões de avaliação, nem os conselhos de governadores, nem o Ministério da Educação as aprovariam por um momento sequer. Pois elas se resumem a isto: se quisermos produzir uma sociedade de pessoas educadas, aptas a preservar sua liberdade intelectual em meio às complexas pressões de nossa sociedade moderna, devemos fazer o tempo retroceder quatro ou cinco séculos, até o ponto em que a educação começou a perder de vista seu verdadeiro objetivo, por volta do final da Idade Média.
Antes que você me rejeite com a frase apropriada — reacionária, romântica, medievalista, laudator temporis acti, ou qualquer rótulo que lhe venha logo à mente — peço que considere uma ou duas questões diversas que pairam, talvez, no fundo de todas as nossas mentes e ocasionalmente surgem para nos preocupar.
Quando pensamos na idade notavelmente precoce em que os jovens ingressavam na Universidade, digamos, na época dos Tudor, e a partir daí eram considerados aptos a assumir a responsabilidade pela condução de seus próprios assuntos, estamos totalmente confortáveis com esse prolongamento artificial da infância e adolescência intelectual até os anos de maturidade física, tão marcante em nossos dias? Adiar a aceitação da responsabilidade para uma data tardia traz consigo uma série de complicações psicológicas que, embora possam interessar ao psiquiatra, dificilmente são benéficas para o indivíduo ou para a sociedade. O argumento padrão a favor de adiar a idade de conclusão escolar e prolongar o período de educação em geral é que agora há muito mais para aprender do que havia na Idade Média. Isso é parcialmente verdade, mas não totalmente. O menino e a menina modernos certamente são instruídos em mais assuntos — mas isso sempre significa que eles são realmente mais instruídos e sabem mais? Esse é exatamente o ponto que vamos considerar.
Alguma vez você achou estranho ou lamentável que hoje, quando a proporção de alfabetização em toda a Europa Ocidental é maior do que jamais foi, as pessoas tenham se tornado suscetíveis à influência da publicidade e da propaganda em massa a um nível até então sem precedentes e inimaginável? Você atribui isso ao mero fato mecânico de que a imprensa, o rádio e afins tornaram a propaganda muito mais fácil de ser distribuída em uma área ampla? Ou às vezes você tem uma suspeita incômoda de que o produto dos métodos educacionais modernos é menos capaz do que poderia ser em separar fatos de opiniões e o comprovado do plausível?
Você já se sentiu incomodado, ao ouvir um debate entre adultos (e, supostamente, pessoas responsáveis), com a extraordinária incapacidade do debatedor médio de falar sobre o assunto em questão, ou de enfrentar e refutar os argumentos dos oradores do lado oposto? Ou já refletiu sobre a incidência extremamente alta de assuntos irrelevantes que surgem em reuniões de comitês, e sobre a grande raridade de pessoas capazes de atuar como presidentes de comitês? E quando você pensa nisso, e pensa que a maioria de nossos assuntos públicos são resolvidos por debates e comitês, você já sentiu um certo aperto no coração?
Você já acompanhou uma discussão nos jornais ou em outro lugar e notou com que frequência os escritores não definem os termos que usam? Ou quantas vezes, se um homem define seus termos, outro assumirá em sua resposta que ele estava usando os termos em um sentido precisamente oposto àquele em que já os havia definido?
Você já se sentiu levemente incomodado com a quantidade de sintaxe descuidada em circulação? E, se sim, você se incomoda porque é inelegante ou porque pode levar a mal-entendidos perigosos?
Você já percebeu que os jovens, quando saem da escola, não só esquecem a maior parte do que aprenderam (que é a única coisa esperada), mas também esquecem, ou demonstram que nunca realmente souberam, como abordar um novo assunto por conta própria? Você se incomoda quando encontra homens e mulheres adultos que parecem incapazes de distinguir entre um livro que é sólido, acadêmico e devidamente documentado, e um que, para qualquer olho treinado, muito visivelmente não é nenhuma dessas coisas? Ou que não conseguem usar um catálogo de biblioteca? Ou que, quando confrontados com um livro de referência, revelam uma curiosa incapacidade de extrair dele as passagens relevantes para a questão particular que lhes interessa?
Você costuma encontrar pessoas para quem, durante toda a vida, uma "matéria" permanece uma "matéria", separada por divisórias impermeáveis de todas as outras "matérias", de modo que elas experimentam uma grande dificuldade em fazer uma conexão mental imediata entre, digamos, álgebra e ficção policial, tratamento de esgoto e o preço do salmão, celulose e a distribuição de chuvas — ou, mais genericamente, entre esferas de conhecimento como filosofia e economia, ou química e arte?
Você ocasionalmente se sente perturbado pelas coisas escritas por homens e mulheres adultos para serem lidas por homens e mulheres adultos? Aqui, por exemplo, está uma citação de um jornal da tarde. Refere-se à visita de uma jovem indiana a este país:
A senhorita Bhosle tem um domínio perfeito do inglês ("Oh, céus!", ela disse certa vez) e um entusiasmo notável por Londres.
Bem, todos nós podemos falar bobagens em um momento de desatenção. É mais alarmante quando encontramos um biólogo renomado escrevendo em um jornal semanal que: "É um argumento contra a existência de um Criador" (acho que ele expressou de maneira mais contundente; mas como, infelizmente, perdi a referência, vou apresentar sua afirmação em seu nível mais leve) "...um argumento contra a existência de um Criador que o mesmo tipo de variações produzidas pela seleção natural possa ser deliberadamente produzido por pecuaristas". É possível sentir-se tentado a dizer que este é, pelo contrário, um argumento a favor da existência de um Criador. Na verdade, claro, não é nenhum dos dois: tudo o que prova é que as mesmas causas materiais (recombinação dos cromossomos por cruzamento e assim por diante) são suficientes para explicar todas as variações observadas — assim como as várias combinações dos mesmos 13 semitons são materialmente suficientes para explicar a Sonata ao Luar de Beethoven e o barulho que o gato faz ao andar sobre as teclas. Entretanto, a performance do gato não prova nem refuta a existência de Beethoven. E tudo o que é provado pelo argumento do biólogo é que ele foi incapaz de distinguir entre uma causa material e uma causa final.
Aqui está uma frase de uma fonte não menos acadêmica do que um artigo de primeira página do Times Literary Supplement:
O francês Alfred Epinas apontou que certas espécies (e.g., formigas e vespas) só conseguem enfrentar os horrores da vida e da morte em associação.
Não sei o que o francês realmente disse: o que o inglês diz que ele disse é claramente sem sentido. Não podemos saber se a vida contém algum horror para a formiga, nem em que sentido pode-se dizer que a vespa isolada que você mata sobre o vidro da janela "enfrenta" ou não "enfrenta" os horrores da morte. O assunto do artigo é o comportamento de grupo no homem, e os motivos humanos foram discretamente transferidos da proposição principal para o exemplo de apoio. Assim, o argumento, na prática, assume o que se propõe a provar — um fato que se tornaria imediatamente aparente se fosse apresentado em um silogismo formal. Este é apenas um pequeno e aleatório exemplo de um vício que permeia livros inteiros, particularmente livros escritos por homens de ciência sobre assuntos metafísicos.
Outra citação da mesma edição do T.L.S. cai como uma luva aqui para encerrar esta coleção aleatória de pensamentos inquietantes — desta vez de uma resenha do livro Some Tasks for Education [Algumas Tarefas para a Educação] de Sir Richard Livingstone:
Mais de uma vez, o leitor é lembrado do valor do estudo intensivo de pelo menos um assunto, a fim de aprender "o significado do conhecimento" e a precisão e persistência necessárias para alcançá-lo. No entanto, em outro momento, há pleno reconhecimento do fato perturbador de que um homem pode ser mestre em um campo e não demonstrar melhor juízo do que seu vizinho em qualquer outro ponto. Ele se lembra do que aprendeu, mas esquece completamente como o aprendeu.
Gostaria de chamar sua atenção particularmente para essa última frase, que oferece uma explicação do que o escritor corretamente chama de "fato perturbador" — que as habilidades intelectuais que nos são conferidas por nossa educação não são facilmente transferíveis para assuntos diferentes daqueles em que as adquirimos: "ele se lembra do que aprendeu, mas esquece completamente como o aprendeu".
Não é o grande defeito de nossa educação hoje — um defeito rastreável em todos os sintomas inquietantes dos problemas que mencionei — que, embora normalmente tenhamos sucesso em ensinar "matérias" aos nossos alunos, falhamos lamentavelmente, de modo geral, em ensiná-los a pensar? Eles aprendem tudo, exceto a arte de aprender. É como se tivéssemos ensinado uma criança, mecanicamente e de forma mecânica, a tocar O Ferreiro Harmonioso no piano, mas nunca tivéssemos ensinado a escala ou como ler música; de modo que, tendo memorizado O Ferreiro Harmonioso, ela ainda não tivesse a menor ideia de como proceder dali para enfrentar A Última Rosa do Verão. Por que digo "como se"? Em certas artes e ofícios, às vezes fazemos exatamente isso, exigindo que uma criança "se expresse" na pintura antes de ensinarmos como manusear as cores e o pincel. Há uma escola de pensamento que acredita ser esta a maneira correta de abordar o trabalho. Mas observe: não é assim que um artesão treinado ensinará a si mesmo um novo meio. Tendo aprendido por experiência a melhor maneira de economizar trabalho e abordar a coisa pelo lado certo, ele começará rabiscando em um pedaço de material qualquer, a fim de "pegar o jeito da ferramenta".
Vamos agora examinar o esquema medieval de educação — o programa escolástico. Não importa, por enquanto, se foi concebido para crianças pequenas ou para estudantes mais velhos, ou quanto tempo se supunha que as pessoas levassem para concluí-lo. O que importa é a luz que lança sobre o que os homens da Idade Média supunham ser o objeto e a ordem correta do processo educativo. O programa era dividido em duas partes: o Trivium e o Quadrivium. A segunda parte, o Quadrivium, consistia em "matérias" e não precisa nos ocupar no momento. O que nos interessa é a composição do Trivium, que precedia o Quadrivium e era a disciplina preliminar para ele. Consistia em três partes: Gramática, Dialética e Retórica, nesta ordem.
Ora, a primeira coisa que notamos é que pelo menos duas dessas "matérias" não são o que chamaríamos de "matérias" de forma alguma: são apenas métodos de lidar com matérias. A gramática, de fato, é uma "matéria" no sentido de que realmente significa aprender uma língua. Naquela época, significava aprender latim. Mas a própria linguagem é simplesmente o meio no qual o pensamento é expresso. Todo o Trivium, na verdade, tinha como objetivo ensinar ao aluno o uso adequado das ferramentas de aprendizagem, antes que ele começasse a aplicá-las às "matérias" em si. Primeiro, ele aprendia uma língua; não apenas como pedir uma refeição em um idioma estrangeiro, mas a estrutura da linguagem — uma língua e, por consequência, a linguagem em si — o que era, como era construída e como funcionava. Em segundo lugar, ele aprendia como usar a língua: como definir seus termos e fazer declarações precisas, como construir um argumento e como detectar falácias em argumentos (em seus argumentos e nos de outras pessoas). A dialética abrangia a Lógica e a Disputa. Em terceiro lugar, ele aprendia a se expressar na língua: como dizer o que tinha a dizer de forma elegante e persuasiva. Neste ponto, qualquer tendência de se expressar de forma prolixa ou de usar sua eloquência para fazer o pior raciocínio parecer o melhor seria, sem dúvida, restringida por sua instrução prévia na Dialética. Caso contrário, seu professor e seus colegas, treinados no mesmo caminho, rapidamente indicariam onde ele estava errado, pois eram eles que o aluno deveria tentar persuadir. Ao final de seu curso, era exigido que ele compusesse uma tese sobre algum tema definido por seus mestres ou escolhido por ele mesmo, e que depois defendesse sua tese contra a crítica do corpo docente. Nessa altura, ele teria aprendido — e ai dele se não — não apenas a escrever um ensaio no papel, mas a falar de forma audível e inteligível de uma plataforma, e a rapidamente usar seu raciocínio quando provocado. A provocação, além disso, não consistiria apenas em personalidades ofensivas ou em perguntas irrelevantes sobre o que Júlio César disse em 55 a.C. — embora sem dúvida a dialética medieval fosse, na prática, animada por muitas dessas trocas de farpas primitivas. Também haveria perguntas, contundentes e argutas, daqueles que já haviam passado pela provação do debate, ou estavam se preparando para passar por ela.
Obviamente, é bastante verdade que fragmentos da tradição medieval ainda persistem ou foram revividos no currículo escolar comum de hoje. Algum conhecimento de gramática ainda é necessário ao aprender uma língua estrangeira — talvez eu devesse dizer "é novamente necessário", pois testemunhei durante a minha vida passarmos por uma fase em que o ensino de declinações e conjugações era considerado um tanto repreensível, e acreditava-se ser melhor aprender essas coisas ao longo do caminho. Sociedades de debate escolar florescem; redações são escritas; a necessidade de "autoexpressão" é enfatizada, e talvez até excessivamente enfatizada. Contudo, essas atividades são cultivadas mais ou menos isoladamente, como pertencentes às disciplinas específicas nas quais são categorizadas, em vez de formarem um esquema coerente de instrução mental ao qual todas as "matérias" estão subordinadas. A "gramática" pertence especialmente à "matéria" de línguas estrangeiras, e a redação à "matéria" chamada "Inglês". Enquanto isso, a Dialética tornou-se quase completamente divorciada do resto do currículo, e é muitas vezes praticada de forma não sistemática e fora do horário escolar como um exercício separado, apenas frouxamente relacionado ao principal objetivo da aprendizagem. Em linhas gerais, a grande diferença de ênfase entre as duas concepções se mantém: a educação moderna se concentra em ensinar matérias, deixando o método de pensar, argumentar e expressar conclusões para ser aprendido pelo estudante ao longo do caminho. A educação medieval concentrava-se primeiro em forjar e aprender a manejar as ferramentas do aprendizado, usando qualquer assunto que estivesse à mão como um material para praticar até que o uso da ferramenta se tornasse segunda natureza.
"Matérias" de algum tipo devem existir, é claro. Não se pode aprender a usar uma ferramenta apenas agitando-a no ar; nem se pode aprender a teoria da gramática sem aprender uma língua real, ou aprender a argumentar e discursar sem falar sobre algo em particular. Os temas de debate da Idade Média eram extraídos em grande parte da Teologia, ou da Ética e História da Antiguidade. De fato, muitas vezes eles se tornavam estereotipados, especialmente no final do período medieval, e os absurdos rebuscados e forçados da argumentação escolástica irritavam Milton e ainda hoje fornecem material para diversão. Se eles eram em si mais desgastados e triviais do que os temas comuns propostos hoje para "produção de texto", não saberia dizer: nós mesmos também podemos ficar um pouco cansados de "Um Dia nas Minhas Férias", "O Que Eu Gostaria de Fazer Quando Sair da Escola", e todo o resto. Mas, a maior parte da chacota é mal direcionada, porque o propósito e o objetivo da tese de debate já foram perdidos de vista. Certa vez, um orador falastrão do grupo Brains Trust entreteve sua audiência (e reduziu o falecido Charles Williams a uma raiva impotente) ao afirmar que na Idade Média era uma questão de fé saber quantos arcanjos podiam dançar na ponta de uma agulha. Não preciso dizer, espero, que nunca foi uma "questão de fé". Era simplesmente um exercício de debate, cujo tema proposto era a natureza da substância angélica: os anjos eram materiais e, se sim, ocupavam espaço? A resposta geralmente considerada correta é, creio, que os anjos são inteligências puras; não materiais, mas limitados, de modo que podem ter localização no espaço, mas não extensão. Uma analogia poderia ser traçada com o pensamento humano, que é similarmente não material e similarmente limitado. Assim, se seu pensamento está concentrado em uma coisa — digamos, a ponta de uma agulha — ele está localizado ali no sentido de que não está em outro lugar. Porém, embora esteja "ali", não ocupa espaço ali, e não há nada que impeça que um número infinito de pensamentos de diferentes pessoas esteja concentrado na mesma ponta de agulha ao mesmo tempo. O assunto adequado do argumento é, portanto, visto como a distinção entre localização e extensão no espaço. O tópico sobre o qual o argumento é exercitado acontece de ser a natureza dos anjos (embora, como vimos, poderia igualmente ter sido outra coisa). A lição prática a ser tirada do argumento é não usar palavras como "ali" de maneira vaga e não científica, sem especificar se você quer dizer "localizado ali" ou "ocupando espaço ali". Muito escárnio foi derramado sobre a paixão medieval pelo preciosismo: mas quando olhamos para o abuso descarado realizado, na imprensa e nas tribunas, de expressões controversas com conotações mutáveis e ambíguas, podemos sentir em nossos corações o desejo de que cada leitor e ouvinte tivesse sido tão defensivamente armado por sua educação a ponto de poder clamar: Distinguo.
Permitimos que nossos jovens, homens e mulheres, saiam desarmados, em uma época em que a armadura nunca foi tão necessária. Ao ensiná-los todos a ler, nós os deixamos à mercê da palavra impressa. Com a invenção do cinema e do rádio, garantimos que nenhuma aversão à leitura os proteja do incessante bombardeio de palavras, palavras, palavras. Eles não sabem o que as palavras significam, não sabem como afastá-las, nem como atenuar seu impacto ou retrucá-las; são presas das palavras em suas emoções, em vez de serem mestres delas em seus intelectos. Nós, que ficamos escandalizados em 1940 quando homens foram enviados para lutar contra tanques blindados com rifles, não nos escandalizamos quando jovens são enviados ao mundo para lutar contra a propaganda em massa com um conhecimento superficial de "matérias". E quando classes inteiras e nações inteiras são hipnotizadas pelas artes de um encantador, temos a impudência de ficar surpresos. Fazemos um discurso vazio sobre a importância da educação — discurso vazio e, ocasionalmente, uma pequena doação em dinheiro; adiamos a idade de saída da escola e planejamos construir escolas maiores e melhores. Os professores trabalham conscienciosamente dentro e fora do horário escolar, até que a responsabilidade se torne um fardo e um pesadelo. E, no entanto, como acredito, todo esse esforço dedicado é em grande parte frustrado, pois perdemos as ferramentas do aprendizado e, na ausência delas, só podemos fazer um trabalho remendado e fragmentado.
O que, então, devemos fazer? Não podemos voltar à Idade Média. Esse é um argumento ao qual nos acostumamos. Não podemos voltar — ou podemos? Distinguo. Eu gostaria que cada termo dessa proposição fosse definido. "Voltar" significa uma regressão no tempo ou a revisão de um erro? O primeiro é claramente impossível por si só; o segundo é algo que homens sábios fazem todos os dias. "Não podemos" — isso significa que nosso comportamento é determinado por algum mecanismo cósmico irreversível, ou meramente que tal ação seria muito difícil diante da oposição que provocaria? "A Idade Média" — obviamente o século 20 não é e não pode ser o século 14; mas se "a Idade Média" é, neste contexto, simplesmente uma frase pitoresca denotando uma teoria educacional particular, parece não haver razão a priori pela qual não devêssemos "voltar" a ela — com modificações. Como já "voltamos", com modificações, à ideia de encenar as peças de Shakespeare conforme ele as escreveu, e não as versões "modernizadas" de Cibber e Garrick, que outrora pareceram ser o auge do progresso teatral.
Vamos nos entreter imaginando que tal retrocesso progressivo seja possível. Façamos uma limpeza geral de todas as autoridades educacionais e nos equipemos com uma pequena e agradável escola de meninos e meninas que possamos capacitar experimentalmente para o conflito intelectual seguindo diretrizes escolhidas por nós mesmos. Dotaremos essas crianças de pais excepcionalmente dóceis; equiparemos nossa escola com professores que estejam perfeitamente familiarizados com os objetivos e métodos do Trivium; teremos nossas instalações e equipe grandes o suficiente para permitir que nossas turmas sejam pequenas o bastante para um gerenciamento adequado; e postularemos uma Banca Examinadora disposta e qualificada para testar os resultados que obtivermos. Assim preparados, tentaremos esboçar um programa de estudos — um Trivium moderno "com modificações", e veremos aonde chegaremos.
Mas primeiro: qual será a idade das crianças? Bem, se alguém vai educá-las em linhas inovadoras, será melhor que elas não tenham nada a desaprender. Além disso, não se pode começar uma coisa boa cedo demais, e o Trivium, por sua natureza, não é aprendizagem, mas uma preparação para a aprendizagem. Portanto, vamos "captá-los jovens", exigindo apenas de nossos alunos que sejam capazes de ler, escrever e fazer contas básicas.
Minhas opiniões sobre psicologia infantil não são, admito, nem ortodoxas nem esclarecidas. Olhando para mim mesmo (já que sou a criança que melhor conheço e a única que posso fingir conhecer por dentro), reconheço em mim três estágios de desenvolvimento. Estes, de maneira aproximada, chamarei de Papagaio, Petulante e Poético — o último coincidindo, aproximadamente, com o início da puberdade. O estágio Papagaio é aquele em que aprender de cor é fácil e, em geral, prazeroso — enquanto o raciocínio é difícil e, no geral, pouco apreciado. Nessa idade, memoriza-se prontamente as formas e aparências das coisas, é agradável recitar as placas dos carros, há alegria no cantar de rimas e no rumor e trovão de polissílabos incompreensíveis — aprecia-se a mera acumulação de coisas. A Idade Petulante, que se segue a esta (e, naturalmente, a sobrepõe em certa medida) é por demais familiar a todos que lidam com crianças: caracteriza-se por contradizer, responder, gostar de "pegar as pessoas no pulo" (especialmente os mais velhos) e propor dilemas (especialmente aqueles com elementos capciosos). Seu potencial para causar aborrecimento é extremamente alto. Geralmente se instala por volta dos primeiros anos do ensino fundamental. A Idade Poética é popularmente conhecida como a idade "difícil". É autocentrada, anseia por se expressar, especializa-se em ser mal compreendida, é inquieta e tenta alcançar independência. Com boa sorte e boa orientação, deve apresentar os primeiros sinais de criatividade, um esforço em direção a uma síntese do que já sabe, e um desejo deliberado de conhecer e fazer alguma coisa em preferência a todas as outras. Bem, parece-me que a estrutura do Trivium se adapta com singular adequação a essas três idades: a Gramática à idade Papagaio, a Dialética à idade Petulante, e a Retórica à idade Poética.
Comecemos, então, com a Gramática. Na prática, isso significa a gramática de alguma língua em particular, que deve ser uma língua flexiva. A estrutura gramatical de uma língua inflexiva é demasiadamente analítica para ser abordada por alguém sem prática prévia em Dialética. Além disso, as línguas flexivas interpretam as inflexivas, enquanto as inflexivas são de pouca utilidade na interpretação das flexivas. Afirmo categoricamente que a melhor base para a educação é a gramática latina. Digo isso, não porque o latim é tradicional e medieval, mas simplesmente porque mesmo um conhecimento rudimentar do latim reduz o trabalho e as dificuldades de aprender quase qualquer outro assunto em pelo menos cinquenta por cento. É a chave para o vocabulário e estrutura de todas as línguas românicas e para a estrutura de todas as línguas germânicas, bem como para o vocabulário técnico de todas as ciências e para a literatura de toda a civilização mediterrânea, juntamente com todos os seus documentos históricos. Aqueles cuja preferência pedante por uma língua viva os persuade a privar seus alunos de todas essas vantagens poderiam substituir pelo russo, cuja gramática é ainda mais primitiva. (O verbo é complicado por uma série de "aspectos" — e tenho a impressão de que possui três vozes completas e um par de aoristos extras — mas posso estar pensando no basco ou no sânscrito). O russo é, naturalmente, útil com os outros dialetos eslavos. Há também algo a ser dito em favor do grego clássico. Mas, minha escolha pessoal é o latim. Tendo assim agradado os Classicistas entre vocês, prosseguirei para horrorizá-los acrescentando que não considero nem sábio nem necessário comprimir o aluno comum no leito de Procrusto da era augustina, com suas formas de verso e oratória altamente elaboradas e artificiais. O latim pós-clássico e medieval, que foi uma língua viva até o final do Renascimento, é mais fácil e, em alguns aspectos, mais vivo, tanto na sintaxe quanto no ritmo. Além disso, o estudo desta forma ajuda a dissipar a ideia generalizada de que o aprendizado e a literatura chegaram a um ponto final quando Cristo nasceu e só despertaram novamente na Dissolução dos Mosteiros.
No entanto, estou me adiantando demais. Ainda estamos na fase gramatical. O latim deve ser iniciado o mais cedo possível — em uma época em que o discurso flexivo não parece mais surpreendente do que qualquer outro fenômeno em um mundo surpreendente; e quando cantar "amo, amas, amat" é tão ritualmente agradável aos sentimentos quanto cantar "uni, duni, tê, salamê, minguê".
Durante essa fase, devemos, é claro, exercitar a mente em outras coisas além da gramática latina. Observação e memória são as faculdades mais vivas neste período. E, se vamos aprender uma língua estrangeira contemporânea, devemos começar agora, antes que os músculos faciais e mentais se tornem rebeldes a entonações estranhas. O francês ou alemão falado pode ser praticado junto com a disciplina gramatical do latim.
Em Inglês, versos e prosa podem ser decorados, e a memória do aluno deve ser abastecida com histórias de todos os tipos — mitos clássicos, lendas europeias e assim por diante. Não acredito que as histórias clássicas e as obras-primas da literatura antiga devam ser usadas como objetos de estudo para praticar as técnicas da Gramática — esse foi um erro da educação medieval que não precisamos perpetuar. As histórias podem ser apreciadas e lembradas em inglês, e relacionadas à sua origem em uma etapa posterior. A recitação em voz alta deve ser praticada, individualmente ou em coro, pois não devemos esquecer que estamos estabelecendo as bases para a Argumentação e a Retórica.
A gramática da História deve consistir, penso eu, em datas, eventos, anedotas e personalidades. Um conjunto de datas ao qual se pode associar todo o conhecimento histórico posterior é de enorme ajuda mais tarde para estabelecer a perspectiva da história. Não importa muito quais datas: as dos Reis da Inglaterra servirão muito bem, desde que sejam acompanhadas por imagens de trajes, arquitetura e outras "coisas do cotidiano", de modo que a mera menção de uma data evoque uma forte representação visual de todo o período.
A Geografia será apresentada de forma semelhante em seu aspecto factual, com mapas, características naturais e representação visual de costumes, trajes, flora, fauna e assim por diante; e acredito que a memorização desacreditada e antiquada de algumas capitais, rios, cadeias de montanhas, etc., não faz mal nenhum. A coleção de selos pode ser incentivada.
A Ciência, no período Papagaio, organiza-se natural e facilmente em torno de coleções — a identificação e nomeação de espécimes e, em geral, o tipo de coisa que costumava ser chamada de "história natural" ou, ainda mais encantadoramente, "filosofia natural". Conhecer os nomes e propriedades das coisas é, nesta idade, uma satisfação em si: reconhecer um cocheiro-do-diabo à primeira vista e assegurar aos adultos tolos que, apesar de sua aparência, ele não pica; conseguir identificar constelações como a Cassiopeia e as Plêiades, e possivelmente até saber as histórias mitológicas por trás desses nomes; estar ciente de que uma baleia não é um peixe, e um morcego não é uma ave — todas essas coisas proporcionam uma agradável sensação de superioridade; enquanto saber distinguir uma cobra-verde de uma víbora ou um cogumelo venenoso de um comestível é o tipo de conhecimento que também tem um valor prático.
A gramática da Matemática começa, é claro, com a tabuada, que, se não for aprendida agora, nunca será aprendida com prazer, e com o reconhecimento de formas geométricas e o agrupamento de números. Esses exercícios levam naturalmente à resolução de cálculos simples de aritmética. Se o aluno demonstrar uma inclinação nesse sentido, uma facilidade adquirida nesta fase é totalmente benéfica. Processos matemáticos mais complicados podem, e talvez devam, ser adiados.
Até agora (exceto, é claro, pelo latim), nosso currículo não contém nada que se afaste muito da prática comum. A diferença será sentida mais na atitude dos professores, que devem encarar todas essas atividades menos como "matérias" em si e mais como uma reunião de material para uso na próxima parte do Trivium. O que esse material realmente é tem importância apenas secundária. Porém, é bom que tudo o que possa ser proveitosamente confiado à memória seja memorizado neste período, seja imediatamente inteligível ou não. A tendência moderna é tentar forçar explicações racionais na mente de uma criança em uma idade muito precoce. Perguntas inteligentes, feitas espontaneamente, devem, é claro, receber uma resposta imediata e racional. Todavia, é um grande erro supor que uma criança não consiga prontamente apreciar e lembrar coisas que estão além de seu poder de análise — particularmente se essas coisas têm um forte apelo imaginativo (como, por exemplo, o poema Kubla Khan de Samuel Taylor Coleridge), uma sonoridade atraente (como algumas das rimas mnemônicas para gêneros em latim), ou uma abundância de polissílabos ricos e ressonantes (como o Quicunque Vult, o Credo de Atanásio).
Isso me lembra a Gramática da Teologia. Vou adicioná-la ao currículo, porque a Teologia é a ciência-mestra, sem a qual toda a estrutura educacional necessariamente carecerá de sua síntese final. Aqueles que discordam disso permanecerão contentes em deixar a educação de seus alunos ainda cheia de questões não resolvidas. Isso terá menos importância do que se poderia imaginar, já que, no momento em que as ferramentas de aprendizagem tiverem sido forjadas, o estudante será capaz de abordar a Teologia por si mesmo, e provavelmente insistirá em fazê-lo e dar sentido a ela. Ainda assim, é bom ter essa matéria também à mão e a postos para que a razão se debruce sobre ela. Na idade gramatical, portanto, devemos nos familiarizar com a história de Deus e do Homem em linhas gerais — ou seja, o Antigo e o Novo Testamento apresentados como partes de uma única narrativa de Criação, Rebelião e Redenção — e também com "o Credo, a Oração Dominical e os Dez Mandamentos". Nesta fase, não importa tanto que essas coisas sejam plenamente compreendidas, mas sim que sejam conhecidas e lembradas. Lembre-se, é material que estamos coletando.
É difícil dizer com precisão em que idade devemos passar da primeira para a segunda parte do Trivium. De modo geral, a resposta é: tão logo o aluno se mostre propenso à Petulância e a argumentos intermináveis (ou, como um diretor de escola que corresponde comigo coloca de forma mais elegante: "Quando a capacidade de pensamento abstrato começa a se manifestar"). Pois assim como, na primeira parte, as faculdades mestras são a Observação e a Memória, na segunda, a faculdade mestra é a Razão Discursiva. Na primeira, o exercício ao qual o restante do material estava, por assim dizer, sintonizado, era a Gramática Latina; na segunda, o exercício-chave será a Lógica Formal. É aqui que nosso currículo mostra sua primeira divergência acentuada dos padrões modernos. O descrédito em que a Lógica Formal caiu é totalmente injustificado; e sua negligência é a causa fundamental de quase todos aqueles sintomas inquietantes que observamos na constituição intelectual moderna. A lógica foi desacreditada, em parte porque caímos no hábito de supor que somos condicionados quase inteiramente pelo intuitivo e pelo inconsciente. Não há tempo agora para argumentar se isso é verdade; contentar-me-ei em observar que negligenciar o treinamento adequado da razão é a melhor maneira possível de tornar isso verdade e garantir a supremacia dos elementos intuitivos, irracionais e inconscientes em nossa composição. Uma causa secundária para o desfavor em que a Lógica Formal caiu é a crença de que ela é inteiramente baseada em suposições universais que são ou improváveis ou tautológicas. Isso não é verdade. Nem todas as proposições universais são desse tipo. Mas, mesmo que fossem, não faria diferença, já que todo silogismo cuja premissa maior está na forma "Todo A é B" pode ser reformulado de forma hipotética. A lógica é a arte de argumentar corretamente: "Se A, então B". O método não é invalidado pelo caráter hipotético de A. De fato, a utilidade prática da Lógica Formal hoje reside não tanto no estabelecimento de conclusões positivas, mas na rápida detecção e exposição de inferências inválidas.
Vamos agora revisar rapidamente nosso material e ver como ele deve ser relacionado à Dialética. No lado da Linguagem, teremos agora nosso Vocabulário e Morfologia bem dominados; daqui em diante, podemos nos concentrar mais particularmente na Sintaxe e Análise (isto é, a construção lógica do discurso) e na história da Linguagem (isto é, como chegamos a organizar nosso discurso para transmitir nossos pensamentos).
Nossa Leitura prosseguirá da narrativa e lírica para ensaios, argumentação e crítica, e o aluno aprenderá a se aventurar nesse tipo de escrita. Muitas lições — sobre qualquer assunto — tomarão a forma de debates; e o lugar da recitação individual ou coral será ocupado por apresentações teatrais, com atenção especial a peças nas quais um argumento é apresentado em forma dramática.
A Matemática — Álgebra, Geometria e o tipo mais avançado de Aritmética — agora entrará no currículo e assumirá seu lugar como o que realmente é: não uma "matéria" separada, mas um sub-departamento da Lógica. Ela não é nem mais nem menos do que a regra do silogismo em sua aplicação particular a números e medidas, e deve ser ensinada como tal, em vez de ser, para alguns, um mistério insondável, e para outros, uma revelação especial, nem iluminando nem sendo iluminada por qualquer outra parte do conhecimento.
A História, auxiliada por um sistema simples de ética derivado da Gramática da Teologia, fornecerá muito material adequado para discussão: O comportamento deste estadista foi justificado? Qual foi o efeito de tal promulgação? Quais são os argumentos a favor e contra esta ou aquela forma de governo? Assim, obteremos uma introdução à História constitucional — um assunto incompreensível para a criança pequena, mas de interesse fascinante para aqueles que estão preparados para argumentar e debater. A própria Teologia fornecerá material para debate sobre conduta e moral; e deve ter seu escopo expandido por um curso simplificado de teologia dogmática (isto é, a estrutura racional do pensamento cristão), esclarecendo as relações entre o dogma e a ética, e prestando-se à aplicação de princípios éticos em instâncias específicas, que é propriamente chamada de casuística. A Geografia e as Ciências também fornecerão material para a Dialética.
Acima de tudo, não devemos negligenciar o material tão abundante na vida cotidiana dos próprios alunos. Há uma passagem encantadora em The Living Hedge [A Cerca Viva] de Leslie Paul, que conta como um grupo de meninos se divertiu por dias discutindo sobre uma chuva extraordinária que caiu em sua cidade — uma chuva tão localizada que deixou metade da rua principal molhada e a outra metade seca. Eles debatiam se seria correto dizer que havia chovido naquele dia sobre a cidade, ou apenas na cidade. Quantas gotas de água seriam necessárias para constituir chuva? E assim por diante. Esse argumento levou a uma série de problemas similares sobre repouso e movimento, sono e vigília, est e non est, e a divisão infinitesimal do tempo. Toda a passagem é um exemplo admirável do desenvolvimento espontâneo da faculdade raciocinativa e da sede natural e apropriada da razão em despertar por definições de termos e exatidão de declarações. Todos os eventos são alimento para tal apetite. A decisão de um árbitro; o grau em que se pode transgredir o espírito de um regulamento sem ser pego pela letra. As crianças são naturalmente argumentativas sobre questões como essas, e sua propensão natural só precisa ser desenvolvida e treinada — e, especialmente, trazida para uma relação inteligível com eventos do mundo adulto. Os jornais estão cheios de bom material para exercícios do tipo: decisões judiciais, por um lado, em casos onde a causa em questão não é muito abstrata; por outro lado, raciocínios falaciosos e argumentos confusos, dos quais as colunas de correspondência de certos jornais que poderíamos identificar estão abundantemente abastecidas.
Onde quer que se encontre assunto para a Dialética, é, naturalmente, muito importante que a atenção seja focada na beleza e economia de uma demonstração refinada ou um argumento bem construído, para que a veneração não morra completamente. A crítica não deve ser meramente destrutiva, embora, ao mesmo tempo, tanto o professor quanto os alunos devam estar prontos para detectar falácias, raciocínios descuidados, ambiguidades, irrelevâncias e redundâncias, e identificá-los prontamente.
Este é o momento em que a elaboração de resumos pode ser utilmente empreendida; juntamente com exercícios como a redação de um ensaio e sua redução, quando escrito, em 25 ou 50 por cento.
Sem dúvida, haverá a objeção de que encorajar jovens na Idade Petulante a desafiar, corrigir e argumentar com seus mais velhos os tornará perfeitamente insuportáveis. Minha resposta é que crianças dessa idade já são insuportáveis de qualquer maneira, e que sua argumentação natural pode muito bem ser canalizada para um bom propósito ao invés de permitir-se que se perca ao vento. De fato, pode ser até menos incômoda em casa se for disciplinada na escola. E, de qualquer forma, os mais velhos que abandonaram o princípio salutar de que as crianças devem ser vistas e não ouvidas não têm ninguém para culpar além de si mesmos. Os professores, certamente, terão que tomar cuidado, ou poderão receber mais do que esperavam. Todas as crianças julgam seus mestres; e se o sermão do Padre ou o discurso anual da Diretora na cerimônia de formatura por acaso oferecerem uma abertura para a ponta da cunha crítica, essa cunha golpeará com mais força sob o peso do martelo Dialético manejado por uma mão treinada. É por isso que eu disse que os próprios professores precisariam passar pela disciplina do Trivium antes de se proporem a impô-la aos seus alunos.
Novamente: o conteúdo do programa nesta fase pode ser qualquer coisa que você queira. As "matérias" fornecem material. Mas, todas devem ser consideradas como mero grão para o moinho mental processar. Os alunos devem ser encorajados a sair e buscar a informação de que precisam e, portanto, guiados para o uso adequado de bibliotecas e livros de referência, assim como ensinados a distinguir quais fontes são confiáveis e quais não são.
Próximo ao final desta fase, os alunos provavelmente começarão a descobrir por si mesmos que seu conhecimento e experiência são insuficientes, e que suas inteligências treinadas precisam de muito mais material para mastigar. A imaginação — geralmente adormecida durante a Idade Petulante — despertará novamente, e os levará a suspeitar das limitações da lógica e da razão. Isso significa que eles estão passando para a Idade Poética e prontos para embarcar no estudo da Retórica. O vasto mundo do conhecimento deve agora ser aberto para que eles possam explorar como quiserem. As coisas outrora aprendidas de cor serão vistas em novos contextos; as coisas antes friamente analisadas podem agora ser reunidas para formar uma nova síntese; aqui e ali uma percepção repentina trará a mais emocionante de todas as descobertas: a revelação de que um truísmo é verdadeiro.
É difícil delinear um programa geral para o estudo da Retórica: é necessária certa liberdade. Na literatura, deve-se permitir novamente que a apreciação tome a frente da crítica destrutiva; e a autoexpressão na escrita pode avançar, com suas ferramentas agora afiadas para cortar com precisão e observar proporção. Qualquer criança que já demonstre disposição para se especializar deve ter liberdade para o fazer: pois, quando o uso das ferramentas foi bem e verdadeiramente aprendido, torna-se disponível para qualquer estudo. Seria bom, penso eu, que cada aluno aprendesse uma ou duas matérias realmente bem, enquanto participa de algumas aulas em disciplinas subsidiárias para manter sua mente aberta às inter-relações de todo o conhecimento. De fato, nesta fase, nossa dificuldade será manter as "matérias" separadas, pois assim como a Dialética terá mostrado que todos os ramos do aprendizado estão inter-relacionados, a Retórica tenderá a mostrar que todo conhecimento é uno. Demonstrar isso, e demonstrar por que é assim, é preeminentemente a tarefa da Ciência Mestra. Mas, seja a Teologia estudada ou não, devemos pelo menos insistir que as crianças que parecem inclinadas a se especializar no lado matemático e científico sejam obrigadas a assistir a algumas aulas de Humanidades e vice-versa. Nesta fase também, a Gramática Latina, tendo cumprido seu papel, pode ser deixada de lado por aqueles que preferem continuar seus estudos de línguas do lado moderno. Enquanto isso, aqueles que provavelmente nunca terão grande uso ou aptidão para matemática também podem ser autorizados a relaxar seus esforços, mais ou menos. De modo geral: o que for mero aparato pode agora ser deixado em segundo plano, enquanto a mente treinada é gradualmente preparada para a especialização nas "matérias" que, quando o Trivium estiver concluído, deve estar perfeitamente bem equipada para abordar por conta própria. A síntese final do Trivium, a apresentação e defesa pública da tese, deve ser restaurada de alguma forma; talvez como uma espécie de "exame final" durante o último período na escola.
O escopo da Retórica também depende de se o aluno será lançado ao mundo aos 16 anos ou se prosseguirá para uma escola particular e/ou universidade. Como, na verdade, a Retórica deveria ser iniciada por volta dos 14 anos, a primeira categoria de aluno deveria estudar Gramática dos 9 aos 11 anos, e Dialética dos 12 aos 14. Seus dois últimos anos escolares seriam então dedicados à Retórica. Neste caso, ela seria de um tipo bastante especializado e vocacional, preparando-o para ingressar imediatamente em alguma carreira prática. Um aluno da segunda categoria terminaria seu curso de Dialética em sua Escola Preparatória e estudaria Retórica durante seus dois primeiros anos na sua Escola Pública. Aos 16 anos, estaria pronto para começar as "matérias" propostas para seu estudo posterior na universidade: e esta parte de sua educação corresponderá ao Quadrivium medieval. O que isso significa é que o aluno comum, cuja educação formal termina aos 16 anos, cursará apenas o Trivium, enquanto os acadêmicos cursarão tanto o Trivium quanto o Quadrivium.
O Trivium é, então, educação suficiente para a vida? Adequadamente ensinado, acredito que deveria ser. Ao final da Dialética, as crianças provavelmente parecerão estar muito atrás de seus contemporâneos educados nos antiquados métodos "modernos", no que diz respeito ao conhecimento detalhado de assuntos específicos. Mas, após os 14 anos, elas deveriam conseguir ultrapassar os outros a passos largos. Na verdade, não estou nem um pouco certa de que um aluno proficiente no Trivium não estaria apto a prosseguir imediatamente para a universidade aos 16 anos, provando-se assim igual ao seu equivalente medieval, cuja precocidade nos surpreendeu no início desta discussão. Isso, certamente, viraria de cabeça para baixo o sistema de escolas públicas e desconcertaria muito as universidades — tornaria, por exemplo, a Competição de Regata Oxford-Cambridge algo bem diferente. Mas, não estou aqui para considerar os sentimentos de instituições acadêmicas: estou preocupada apenas com o treinamento adequado da mente para enfrentar e lidar com a formidável massa de problemas não digeridos que o mundo moderno apresenta. As ferramentas de aprendizagem são as mesmas, em qualquer e todo assunto; e a pessoa que sabe como usá-las irá, em qualquer idade, dominar um novo assunto na metade do tempo e com um quarto do esforço despendido pela pessoa que não tem as ferramentas à sua disposição. Aprender seis matérias sem lembrar como foram aprendidas não facilita em nada a abordagem de uma sétima. Ter aprendido e lembrar a arte de aprender torna a abordagem de qualquer assunto uma porta aberta.
É evidente que o ensino bem-sucedido deste currículo neo-medieval dependerá ainda mais do que a habitual colaboração de todo o corpo docente em prol de um objetivo comum. Como nenhuma matéria é considerada um fim em si mesma, qualquer tipo de rivalidade na sala de professores será lamentavelmente inadequado. O fato de um aluno ser, infelizmente, obrigado, por algum motivo, a perder a aula de História às sextas-feiras, ou a aula de Shakespeare às terças-feiras, ou até mesmo omitir uma disciplina inteira em favor de outra, não deve ser motivo de ressentimentos — o essencial é que ele adquira o método de aprendizagem no meio que melhor lhe convier. Se a natureza humana sofre com esse golpe no orgulho profissional em relação à sua matéria, há consolo no pensamento de que os resultados das provas finais não serão afetados; pois as provas serão organizadas de modo a serem um exame de método, independentemente dos meios.
Acrescentarei que é extremamente importante, para o próprio bem de cada professor, que ele seja qualificado e requerido a ensinar todas as três partes do Trivium. Caso contrário, os Mestres da Dialética, em particular, poderiam ver suas mentes enrijecendo-se em uma adolescência permanente. Por essa razão, os professores das Escolas Preparatórias também deveriam ministrar aulas de Retórica nas Escolas Públicas às quais estão vinculados. Ou, se não estiverem vinculados, que busquem lecionar em outras escolas da mesma vizinhança. Alternativamente, algumas aulas preliminares de Retórica poderiam ser ministradas nas Escolas Preparatórias a partir dos 13 anos de idade.
Antes de concluir estas sugestões necessariamente muito esquemáticas, devo dizer por que considero necessário, nos dias de hoje, voltar a uma disciplina que havíamos descartado. A verdade é que nos últimos 300 anos ou mais, temos vivido de nosso capital educacional. O mundo pós-Renascença, perplexo e empolgado com a profusão de novas "matérias" que lhe eram oferecidas, rompeu com a antiga disciplina (que, de fato, havia se tornado tristemente monótona e estereotipada em sua aplicação prática) e imaginou que dali em diante poderia, por assim dizer, deleitar-se em seu novo e ampliado Quadrivium sem passar pelo Trivium. Mas a tradição escolástica, embora quebrada e mutilada, ainda persistia nas escolas públicas e universidades: Milton, por mais que protestasse contra, foi formado por ela — o debate dos Anjos Caídos e a disputa de Abdiel com Satanás trazem as marcas escolásticas e poderiam, incidentalmente, figurar proveitosamente como passagens definidas para nossos estudos de Dialética. Até o século 19, nossos assuntos públicos eram em sua maioria gerenciados, e nossos livros e jornais eram em grande parte escritos, por pessoas criadas em lares e treinadas em lugares onde essa tradição ainda estava viva na memória e quase no sangue. Da mesma forma, muitos hoje que são ateus ou agnósticos em religião são governadas em sua conduta por um código de ética cristã tão enraizado em seus pressupostos inconscientes que nunca lhes ocorre questioná-lo.
Mas não se pode viver de capital para sempre. Uma tradição, por mais firmemente enraizada que esteja, se nunca for regada, embora morra com dificuldade, no final acaba morrendo. E hoje, um grande número — talvez a maioria — dos homens e mulheres que lidam com nossos assuntos, escrevem nossos livros e jornais, realizam pesquisas, apresentam nossas peças e filmes, falam de nossas plataformas e púlpitos — sim, e que educam nossos jovens, nunca, nem mesmo em uma memória tradicional persistente, passaram pela disciplina escolástica. Cada vez menos as crianças que chegam para serem educadas trazem consigo qualquer parte dessa tradição. Perdemos as ferramentas do aprendizado — o machado e a cunha, o martelo e a serra, o cinzel e a plaina — que eram tão adaptáveis a todas as tarefas. Em vez delas, temos meramente um conjunto de dispositivos especializados, e cada um realizará apenas uma tarefa e nada mais. E para usá-los o olho e a mão não recebem treinamento algum, de modo que nenhum homem jamais vê o trabalho como um todo ou "enxerga o fim do trabalho". De que adianta empilhar tarefa sobre tarefa e prolongar os dias de trabalho, se ao final o objetivo principal não é alcançado? Não é culpa dos professores — eles já trabalham duro demais. A loucura combinada de uma civilização que esqueceu suas próprias raízes está forçando-os a sustentar o peso cambaleante de uma estrutura educacional construída sobre areia. Eles estão fazendo por seus alunos o trabalho que os próprios alunos deveriam fazer. Pois o único verdadeiro fim da educação é simplesmente este: ensinar os homens a aprender por conta própria; e toda instrução que falhe em fazer isso é um esforço desperdiçado.
DOROTHY L. SAYERS
Witham, Essex